quinta-feira, 9 de outubro de 2008

"Pena de Morte" - apontamentos

Amanhã, 10 de Outubro,é assinalado mais um "Dia Mundial Contra a Pena de Morte".

Iniciado pela "World Coalition Against Death Penalty" (Coligação Mundial Contra a Pena de Morte), em 2003, o assinalar deste dia visa, essencialmente, sensibilizar Organizações, Estados, Nações e cidadãos para o respeito pelo valor e bem fundamental que é a vida humana e para a necessidade de abolir, definitivamente, a pena capital e as execuções, em todos os ordenamentos jurídicos.


Este ano, os olhos estão virados para a Àsia onde, de acordo com dados recolhidos pela Amnistia Internacional, ocorreram pelo menos 664 execuções, - apenas no ano de 2007 - e se estima que lá se verifiquem cerca de 85% a 95% de todas as execuções verificadas no mundo.

"Asia: é tempo de acabar com as execuções"!

O direito à vida é de todos e inalienável; todos devemos assinar pelo seu reconhecimento! Porque esta causa é de todos, desde já aqui deixo link para a Petição OnLine!

Devo confessar que, no geral, tenho orgulho em ser português, mas nesta matéria sou até vaidoso pela nacionalidade que detenho.
Portugal foi um dos países pioneiros relativamente à abolição da pena de morte: em 1852 foi abolida a pena capital pela prática de crime político e em 1 de Julho de 1867 foi, finalmente, abolida relativamente a todos os crimes (excepto os militares, para os quais a abolição apenas surgiu em 1911). Note-se que Portugal aboliu a pena de morte muito antes da, grande defensora dos direitos e liberdades, França (1981).

"Está pois a pena de morte abolida nesse nobre Portugal, pequeno povo que tem uma grande história. (...) Felicito a vossa nação. Portugal dá o exemplo à Europa. Desfrutai de antemão essa imensa glória. A Europa imitará Portugal. Morte à morte! Guerra à guerra! Viva a vida! Ódio ao ódio. A liberdade é uma cidade imensa da qual todos somos concidadãos" - referia Victor Hugo, em 1876, a propósito da abolição da pena capital em Portugal.

De facto, em Portugal, mesmo antes de abolida a pena de morte, já se havia renunciado à sua execução, sendo que remonta a 1 de Julho de 1772 a data em que é executada pela última vez uma mulher ("Luísa de Jesus foi executada, em Coimbra, aos 22 anos de idade por ter assassinado 33 bebés abandonados, que ela ia buscar à "roda" de Coimbra, umas vezes usando o seu nome verdadeiro outras vezes usando um nome falso, apenas com o intuito de se apoderar do enxoval da criança e embolsar os 600 réis que eram dados cada vez que se ia buscar uma criança") e a última execução de pena de morte, de que se tem conhecimento em território português, ocorreu em Abril de 1846.


Por outro lado, importa salientar que grande parte dos países lusófonos (Cabo Verde, Moçambique, S. Tomé e Princípe, Angola, Guiné Bissau, Brasil) aboliram a pena de morte.

Na actualidade do mundo de hoje e tomando em conta os dados recolhidos pela Amnistia Internacional, podemos contabilizar um total de 137 países que aboliram a pena capital, "de jure" ou "de facto" - 91 países aboliram-na para todos os crimes, como por exemplo Portugal; 11 países aboliram-na para todos os crimes excepto para casos extraordinários de crimes de guerra, dos quais servirá de exemplo o Brasil; 35 países prevêm a aplicação da pena de morte, mas não a executam há largos anos, como por exemplo a Rússia.

Contudo, ainda existem cerca de 60 países no mundo a aplicar a pena capital e a condenar pessoas humanas à morte por decapitação, electrocução, enforcamento, injecção letal, fuzilamento ou, com enorme crueldade, por apedrejamento!
Em 2007, pelo menos 1.252 pessoas humanas foram executadas e 3.347 condenadas por sentença judicial a pena de morte!
China, Paquistão, Irão, Iraque, Arábia Saudita e, o "país de todas as liberdades e garantias", Estados Unidos da América, continuam a aplicar a mais cruel pena, que alguma vez se poderá condenar alguém: a morte!

Pessoalmente, sempre fui acérrimo defensor da não aplicação da pena capital, seja em que situação concreta nos coloquemos. Já várias vezes discuti e debati o tema e, se é certo que compreendo a dor e angústia que, alguns pais ou parentes, possam sentir pela perda de filhos, familiares e entes queridos, continuo a não tomar como Justiça a execução de um ser humano, independentemente do crime que haja praticado. Que dor sentirão os que amavam o executado? Uma dor diferente? E será justo condená-los indirectamente também a eles, inocentes, a essa mesma dor?

O direito à vida é inalienável e nenhum homem, instituição ou Estado tem legítimidade natural para retirar a vida a um ser humano. Pena de morte é punir um erro, com outro erro! A desconcertante "Lex Talionis" - "olho por olho, dente por dente" - é uma lei injusta; mata-se argumentando que ninguém tem direito a matar e por isso deve ser morto! Será coerente? Viveremos "adaeternum" no reino da Babilónia?

Não sou de religiões mas, pelo que sei, quando Caim matou Abel, nem Deus lhe retirou a vida; expulsou-o! Não poderá também o Homem apenas expulsar da sociedade quem nela errou, retirando-lhe a liberdade ainda que perpetuamente?

Nos dias que correm, banal se torna escutar de outrem que "Se houvesse pena de morte em Portugal, isto já não era assim!", referindo-se ao aumento de criminalidade violenta. Contudo, estudos científicos mais recentes sobre a relação entre a pena de morte e as percentagens de homicídios, conduzidas pelas Nações Unidas em 1988 e actualizadas em 1996, não conseguiram encontrar provas científicas de que as execuções tenham um efeito dissuasor superior ao da prisão perpétua.
O enforcamento de Saddam Hussein não protegeu a humanidade da existência de outros ditadores, adeptos convictos de genocídios em massa!
“A prisão perpétua tem suficiente poder de coerção da criminalidade, oferecendo, além disto, a vantagem da plena recuperação do criminoso.”, referia Ávila em 1967.

Acresce que, todo e qualquer sistema judicial é falível; passível e permeável a erros. Quem julga e condena são juízes, pessoas humanas passíveis de errar, devendo todos nós assumir que o errar é próprio da essência humana. A história é pródiga em exemplos de erros judiciais. Veja-se o "Caso Wanninkhof", em Espanha; o caso de António Madeira, em França; os vários casos nos EUA (o teste de DNA, por exemplo, demonstrou a inocência de 72 presos condenados, 8 deles condenados à morte. E desde 1973, nos Estados Unidos, um grande número de condenados à morte teve que ser libertado depois de 12, 18 anos no “corredor da morte”), nomeadamente o de James Lee Woodward, recentemente libertado após 27 anos de injusto cativeiro! Atente-se que ,ainda hoje não se sabe se, no célebre "Processo dos Távoras", se executaram verdadeiros culpados!

Agora vejamos: se em erro se condenar um inocente a prisão, poderemos, após a percepção desse mesmo erro, repôr a Justiça, libertando o injustamente encarcerado e tentando ressarcir os danos que lhe foram causados com tal privação de liberdade, através de uma indemnização; se em erro se condenar um inocente à morte, após a execução dessa sentença, ainda que seguros e convictos de que se errou no julgamento, nada poderemos fazer para realizar Justiça. A morte não tem retrocesso! É irreversível e irremediável! É humanamente impossível voltar a dar a vida que se retirou! Deveremos punir quem erradamente julgou e sentenciou a morte de um inocente, entrando numa incessante espiral de injustiças?

Marquês De Lafayette referia: “Pedirei a abolição da pena de morte enquanto não me provarem a infalibilidade dos juízos humanos”.

Tomo, aqui e na vida, a mesma posição e, sobre o tema, aconselho o visionamento do filme "The Life of David Gale ( Inocente ou Culpado)", com uma representação soberba de Kevin Spacey. Para ver, sentir e refletir!

Resta-me findar por referir que o art. 1º do Protocolo nº6 à Convenção Europeia dos Direitos do Homem (instrumento de direito internacional que faz parte do direito interno - atento o disposto no art. 8º nº 2 da CRP -, em vigôr na ordem jurídica portuguesa desde 1 de Novembro de 1986)
dispõe que "A pena de morte é abolida. Ninguém pode ser condenado a tal pena ou executado".
O art. 1º do
Protocolo nº13 à Convenção Europeia dos Direitos do Homem (em vigôr na ordem interna portuguesa desde 1/02/2004) dispõe no mesmo sentido.

Por sua vez, o art. 24º da Constituição da República Portuguesa refere claramente que "a vida humana é inviolável" e "em caso algum haverá pena de morte"! Ler tal preceito, rejuvenesce o meu orgulho lusitano!

"Que os maus não matem os bons nem os bons matem os maus. Digo sem hesitação que não existem assasinos bons." (Pablo Neruda)


domingo, 5 de outubro de 2008

"Lei do Ruído"

No tempo que vivemos, o silêncio é um bem raro. É um bem escasso e, consequentemente, um bem económico.

Qual de nós, comum dos mortais, nunca experienciou a derradeira frustração de querer alcançar um pouco de silêncio e não conseguir?

Nos ruidosos tempos que correm, tal aparenta ser apenas apanágio dos Deu$es; um prazer que só eles conseguirão alcançar e fruir. Sirenes, buzinas, motores, máquinas, músicas, Tv's, etc... ; uma incessante amálgama de sons e ruídos; tudo é anti-silêncio e pró-evolução - tome ela o rumo que tomar! A poluição sonora instalou-se.

Decerto muitos argumentarão que ainda existem locais no Mundo onde é possivel sentir o prazer do silêncio...
Vero! Mas isso tem um determinado valor; um determinado preço de mercado e muitas das vezes apenas acessível aos Deu$es...

Contudo e apesar da ruidosa parafernália que actualmente vivemos, ainda existe um local onde idealizamos conceder à nossa audição a prazentosa sensação de silêncio: a nossa casa! Deitados sobre a cama, escutando o vazio... ouvindo o nada! Uma divina - porque rara - sensação...

Mas, normalmente, essa idealização não passa disso mesmo... de uma doce mas vã quimera. No momento em que tudo aparenta propiciar o desfrutar do desejado prazer do silêncio... BOOM ... o vizinho decide fazer obras em casa, aspirar a mesma ao som do último CD de um qualquer artista musical, experimentar o sistema surrround ou
quiça discutir com a esposa, atento um violento ataque de ciúmes!

Todos estaremos cientes dos efeitos nocivos da poluição sonora na saúde e no bem estar humano (perda de concentração, stress, perda de audição, transtornos do sono, perda de rendimento e produtividade, dificuldades nas comunicações, etc...). A prevenção do ruído e o controlo da poluição sonora, visando a salvaguarda da saúde humana e o "welfare" das populações, constitui hoje uma tarefa fundamental do Estado e da
Lei de Bases do Ambiente (Lei nº11/87 de 11 de Abril), ou seja, cabe ao Estado legislar no sentido de estabelecer um regime que proteja a sociedade dos incómodos dos ruídos e dos malifícios da poluição sonora.

Esse regime jurídico encontra-se actualmente previsto no
Regulamento Geral do Ruído (D.L. nº9/2007 de 27 de Janeiro) e nele se estabelecem limites às actividades ruidosas susceptíveis de causar incomodidade.

Vejamos alguns aspectos mais usuais e correntes que, na prática, não raras vezes são descurados ou desconhecidos:


a) ruídos produzidos em virtude de trabalhos ou obras de construção civil, realizadas fora do nosso edifício habitacional.

Este tipo de trabalhos é legalmente catalogado como "actividade ruidosa temporária" - art. 3º alínea b) - e o seu exercício é, em absoluto, proibido nas proximidades de hospitais ou estabelecimentos similares (a todo o tempo) e escolas (durante o período de aulas). De igual modo o é proibido nas proximidades de edíficios de habitação, aos Sábados, aos Domingos e feriados e nos dias úteis entre as 20H00 e as 8H00 - art. 14º.
O exercício de tais actividades pode contudo, de forma, excepcional e devidamente justificada, ser autorizado mediante requerimento e emissão de "licença especial de ruído" - art. 15º - a emitir pelos competentes serviços municipais.

b) ruídos produzidos em virtude de trabalhos ou obras, no interior do nosso edifício habitacional.

A realização deste tipo de obras, quando constitua fonte de ruído, não necessita de licença ou autorização especial, mas apenas é legalmente permitida nos dias úteis entre as 8H00 e as 20H00 - art. 16º nº1.
Acresce que, o responsável pela sua realização deverá afixar, em local visível a todos os utilizadores do edifício, um aviso com a previsível duração das obras e com o período em que se preveja ocorrer maior intensidade de ruído - art. 16º nº 2.

c) ruídos emitidos por "saídas de escape" de veículos motores.

Os valores de ruído sonoro permitidos são os estabelecidos no livrete do veículo, acrescidos de uma tolerância de 5dB - art. 22º nº 1.
A fiscalização e controlo é efectuada aquando a realização de inspecção periódica a que serão obrigatóriamente sujeitos.

d) "ruídos de vizinhança"

Conceitualmente são ruídos associados ao uso habitacional e ás actividades que lhe são inerentes, produzidos directamente por alguém ou por intermédio de outrem, por coisa à sua guarda ou animal colocado sob sua responsabilidade, que, pela sua duração, repetição ou intensidade, seja susceptível de afectar a saúde pública ou a tranquilidade da vizinhança [art. 3º alínea r)]. É aconselhável tentar diminuir verificação ou a intensidade de tais ruídos entre as 23H00 e as 7H00 (art. 24º nº 1). Para espanto de alguns, durante o período temporal que medeia as 7H00 e as 23H00 , a realização de tais ruídos também não é ilimitadamente permitida, sendo possível as autoridades policiais fixarem um prazo ao "vizinho barulhento" para que cesse a incomodidade (art. 24º nº2).

O exercício de actividades ruidosas em violação do supra explanado, constitui ilícito contra-ordenacional; são "contra-ordenações ambientais leves", nos termos do disposto no art. 28º nº 1 do Regulamento Geral do Ruído.
O "lesado" poderá efectuar queixa/denúncia junto das competentes autoridades policiais, requerendo desde logo a suspensão ou cessação da actividade ruidosa, devendo ser por tais autoridades lavrado auto da ocorrência a remeter ao Presidente da Câmara Municipal para instauração do respectivo procedimento de contra-ordenação e aplicação de coima [art. 18º, 24º, 30º nº2 do referido diploma legal].


Importa contudo concluir que, embora nem sempre conseguamos atingir o silêncio que almejamos e que deveria ser atingível, atento o regime jurídico atrás exposto, é de relevar um aspecto crucial nesta matéria: em prol da boa sociabilização e vizinhança, devemos imbuir-nos aqui de elevado bom senso, de modo a não nos tornar-mos de tal modo mesquinhos e picuinhas, coartando outros tantos direitos fundamentais alheios apenas em prol do nosso direito ao silêncio.

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Conferência “E foram felizes para sempre ….??”,

A Associação Portuguesa de Mulheres Juristas (APMJ) e a Escola de Direito do Porto da U.C.P vão realizar nos próximos dias 23 a 25 de Outubro a Conferência “E foram felizes para sempre ….??”, a fim de debater as recentes alterações ao regime jurídico do Divórcio.

Analisar criticamente, debater ideias e posições jurídicas sempre se afigurou essencial, sensato e salutar em prol da evolução legislativa de qualquer Estado de Direito e na realização de uma efectiva democracia.

Porque solicitada e importante a divulgação desde tipo de eventos, aqui deixo exposto a qualquer interessado o Programa e a ficha de inscrição para a supra mencionada Conferência.