quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

"Alimentos gravídicos"


aqui tinha comparado, em parte, a eficácia e a concretização prática do direito a alimentos no ordenamento jurídico português, em relação ao brasileiro.

Sucede que, muito recentemente, o direito a alimentos evoluiu na legislação brasileira, ao entrar em vigôr a Lei nº 11.804 de 5 de Novembro de 2008.

Esta nova lei vem disciplinar o "direito a alimentos da mulher gestante e a forma como será exercido", ou seja, os "alimentos gravídicos", devidos ao nascituro e recebidos pela gestante, sendo que tais alimentos compreenderão "os valores suficientes para cobrir as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive as referentes à alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo médico, além de outras que o juiz considere pertinentes".

O futuro pai ficará então obrigado a contribuir, face ás despesas ocasionadas pela gravidez e inerentes condição de gestante, na proporção dos seus recursos económicos, face às necessidades da mulher grávida, bastando para tal a existência de indícios da paternidade.

Parece-me uma posição jurídica extremamente justa, tomada pelo legislador brasileiro.

A concepção de uma vida humana tem por regra (que lógicamente não exclui excepções) implícito um acto sexual, praticado por dois indíviduos de sexo diferente. Sendo assim, se para a concepção de uma vida contribuiram, homem e mulher, de igual modo deverão ambos ser responsabilizados por todas as despesas, decorrentes de tal facto e inerentes à gestação. Não é justo onerar apenas a mulher gestante (por vezes, economicamente, a parte mais desprotegida) com tais encargos!

A obrigação de prestar alimentos aos filhos inicia-se assim, não com o nascimento, completo e com vida, mas com a própria concepção do nascituro.Com a concepção nasce a obrigação de prestar "alimentos gravídicos", até ao nascimento com vida.

A partir de tal momento, tal prestação é automáticamente convertida em pensão de alimentos devidos a menor, a qual deverá ser revista (a pedido de uma das partes), uma vez que na sua razão de ser estarão subjacentes outras necessidades (educação, vestuário, actividades extra-curriculares, etc.) e naturalmente outros encargos.

Se por um lado se afigura justa, como já se disse, a posição jurídica, por outro, há que prever e questionar as controvérsias jurídicas a que pode dar azo o legislado na Lei nº 11.804.

Por exemplo, se os alimentos são devidos desde a concepção, poderemos subsumir que o legislador entende existir vida humana a partir da concepção? E que consequências retirar dessa subsunção ao nível da protecção juridico-penal conferida ao bem vida?

(note-se que, actualmente, a doutrina e jurisprudência portuguesa, assim como grande parte da restante em Direito Comparado, vai no sentido de que existe vida intra-uterina a partir do momento da nidação do zigoto no útero - que se verificará, em regra, no 13º dia após a fecundação - e vida humana a partir do acto de nascimento - quando se iniciam contracções ritmadas, intensas e frequentes que previsivelmente conduzirão à expulsão do feto)

Outra situação controversa que poderá surgir e que, aparentemente, não se afigura ainda solucionada, parece ser o facto de que, se para serem fixados e atribuídos "alimentos gravídicos", bastará existirem indícios (fortes presumo!) da paternidade, não sendo assim necessária a prévia certeza confirmada da paternidade, posteriormente quando for junto aos autos o resultado negativo de tal paternidade, como restituir ao "falso pai" aquilo que ele já prestou à gestante a título de alimentos? Terá ele direito de regresso, relativo tais montantes, sobre a gestante, a título de enriquecimento sem causa? Ou será sobre o verdadeiro pai? E como será ressarcido dos danos não patrimoniais injustamente causados pela autora do pedido de alimentos?

Estas parecem ser importantes e pertinentes questões a cogitar e a resolver pela judicatura brasileira!

Por cá, em Portugal, temos algo parecido: o art. 1884º do Cód. Civil, que prevê "alimentos à mãe". Mas não tenho conhecimento que seja prática comum o pedido de alimentos relativos ao período de gravidez...

Além disso, o preceito legal em questão tem como âmbito subjectivo o "pai não unido pelo património à mãe do filho"... Então e se estiver unido pelo matrimónio, mas separado de facto, da mãe do filho? Essa mãe gestante, incoerentemente, já não tem direito a "alimentos gravíticos"? Ou estará ele compreendido no dever de assistência, previsto no art. 1675º do Cód. Civil? -vide nº 2.

Há ainda que suscitar, junto do meio jurídico, em geral, e do legislador, em particular, a questão da pertinência e da justiça no reconhecimento do direito a "alimentos gravíticos", a prestar à gestante, e fazer uma análise minuciosa e cuidada da realidade jurídica que temos e aquela que, o fluir e a dinâmica nas relações sociais, proclamam!

Resta aguardar, com serenidade, por tal evolução na prática jurídica...


2 comentários:

Daniela Dória disse...

Olá!!!Concordo com a nova lei gerada no Brasil em parte. Durante a gestação os gastos são tantos que, quando se é mãe solteira ou se torna mãe solteira não por opção , mais por abandono do companheiro, muitas mulheres não tem como zelar pela sua saúde que decorrente vem a do bebé. Por isso acho correto, o que sabemos é que o feto não foi gerado só. Mais por outro lado discordo quando o suposto pai é obrigado sem que hajá um prova há favor dele. Bom a justiça brasileira já conheçe quem chega aos seus tribunais, talvez por isso uma lei tão severa para os homens, não é atoa que no Brasil não pagar pensão alimentícia da cadeia.

vilessis disse...

Condordo em parte.Realmente há necessidade de cuidados a gestante e o feto para que possa ter uma criança sadia.Quanto à idoneidade da grávidaq é que me questiono.Uma vez não tendo certeza de quem é o pai, alguém irá responder por essas despesas e na dúvida que ao esclarecer a não paternidade se o suposto pai deverá ser resituído dessas despesas com alimentação gravídica ou não.Tema bastante complexo.