sábado, 2 de agosto de 2008

Prisão por não pagamento de alimentos?

Tudo o que nasce ... morre! Inevitável o triste fado de tudo o que tem uma génese.

Assim o é com o casamento. Também ele, inevitavelmente, acaba por findar, seja com a morte de um dos cônjuges, seja, por antecipação, com o divórcio.

Mas nem tudo morre... Morrem as raízes ( não por regra!), morre o tronco, morrem os ramos e folhagens, mas... os frutos já cairam e foram colhidos.

Os FILHOS!

Esses ficam... esses perduram. E com eles nasce um dos mais debatidos e exasperados debates jurídicos a que podemos assistir em contencioso familiar...

O DIREITO A ALIMENTOS, devido aos filhos!

Na prática, várias questões controversas se colocam relativamente aos alimentos.

Primeiro importa distinguir os alimentos devidos a menores (aos filhos) de outras obrigações alimentícias legalmente estatuídas.

De seguida releva esclarecer o que são os alimentos devidos a menores enquanto figura jurídica: tudo o que é indispensável ao sustento, habitação, vestuário, instrução e educação do menor (Art. 2003º do Cód. Civil)

Depois existem dois pontos que há que analisar com mais minúcia:

1. A necessidade dos alimentos e os critérios de atribuição do direito a alimentos.
2. A efectivação prática do direito a alimentos judicialmente atribuido.

Ora vejamos,

1 - Quando os menores ficam à guarda de um dos pais, não será justo exigir a esse progenitor que assuma todas as despesas inerentes a essa guarda. A alimentação, a habitação e gastos inerentes, o vestuário e calçado, as despesas com a saúde, segurança, instrução, educação e actividades extra-curriculares do menor, por exemplo, não devem ser pagas apenas por esse progenitor. Esse dever recai sobre ambos os pais, até que os filhos estejam em condições de suportar, pelo produto do seu trabalho ou outros rendimentos, esses encargos, (Art. 1874º nº 2, 1878º nº 1, 1879º do Cód. Civil) , estejam os pais casados ou não, juntos ou separados! E a isso não podem renunciar! (Art. 1882º do C.Civil)

Por isso mesmo, o progenitor que fica com a guarda do filho menor, tem legitimidade legal para requerer ao tribunal que fixe o montante com o qual o outro progenitor terá que comparticipar nas despesas com os alimentos (em sentido jurídico) do menor. (Art. 186º e segs. do D.L. nº 314/78 de 27-10)

Mas como se calcula esse montante?

Aparentemente seria de fácil aferimento: calcular-se-ia o total de todas as despesas com o menor e dividir-se-ia esse montante pelos dois progenitores!

Sucede que, na prática, o cálculo não é assim tão linear e as decisões judiciais devem ser pautadas pela casuística e equidade.

Porque montante a fixar a título de alimentos ao menor deve ser proporcional na razão das necessidades do alimentando e das possibilidades do alimentante. Não se pode exigir a um pai que dê a um filho, o que não tem! Não lhe pode ser exigível que proporcione um montante, a título de alimentos, que o filho efectivamente não necessite, privando o alimentante de uma vida digna. (Art. 2004º nº 1 do C. Civil)

Na realidade e na prática forense, enquanto advogado, tenho conhecimento pessoal de algumas decisões judiciais que
"contra legem" colocam o alimentante em situações de precaridade, atingindo até a própria subsistência do progenitor.

O alimentante não deverá ser penalizado em prestar alimentos em montante superior às suas capacidades ou possiblidades! Os doutos magistrados judiciais dessa exigência não devem descurar!

Mas tal "erro de cálculo" deve-se a várias permissas que pecam por erróneas.

Por exemplo, há quem erradamente entenda que o valor dos alimentos deve compensar as despesas com os encargos da casa do progenitor que tem a guarda. O alimentante teria que pagar assim as despesas com o menor e... com o outro progenitor! ERRADO! O valor de alimentos é devido aos filhos e não ao progenitor; há que atender às necessidades daqueles e não às deste último!

Depois, há quem entenda que o progenitor que não tem a guarda, deve pagar todas as despesas com o menor! ERRADO! Ele deve comparticipar. O progenitor que tem a guarda também! E atendendo às possibilidades económicas de cada um! E se o progenitor que detém a guarda alegar não deter meios para comparticipar, por não exercer actividade laboral, advogo que há que aferir as causas dessa mesma situação: não trabalha porque não pode ou não trabalha por opção própria? É uma situação de desemprego involuntário ou voluntário?

Alguns casos existem em que o progenitor que requer os alimentos tem mais possibilidade económicas do que o progenitor requerido e ainda assim lhe pede valores incapacitantes a título de alimentos devidos aos filhos! Porquê? Mesquinhez, vingança, orgulho ferido, despeito, ou...
"nem que seja só para aborrecer ou atormentar e fazer-se presente na vida do outro"! É a perfidez humana... Há que aferir casuísticamente... a bem da Justiça!

2 - E o que fazer quando o progenitor judicialmente obrigado a prestar alimentos não os satisfizer? Pode o outro progenitor obrigá-lo a pagar o montante em dívida?

Não será caso raro... Aliás, muito pelo contrário! É uma das principais causas de contenciosos nos tribunais (e não só em Portugal!).
Na prática, e não raras as vezes, bastará tão só o progenitor, que detem a guarda do menor, iniciar um relacionamento afectivo com um novo parceiro para (mais uma vez por mesquinhez, vingança, despeito, etc.) o outro progenitor, obrigado a prestar alimentos, cesse o pagamento!

A lei, prevê formas de reagir contra esta realidade:

- com a cobrança coerciva da prestação de alimentos, através do procedimento pré-executivo previsto no Art. 189º do D.L. nº 314/78 de 27-10 e requerer ao tribunal que o alimentante devedor seja condenado em multa e em indemnização a favor do menor (Art. 181º do mesmo diploma)

- com interposição de acção executiva especial por alimentos, nos termos do disposto no Art 1118º e segs. do Cód. Proc. Civil.

Mas... e se o alimentante devedor não tiver absolutamente nenhuns rendimentos ou bens conhecidos, capazes de serem deduzidos ou executados?

PODE O PROGENITOR JUDICIALMENTE OBRIGADO A PRESTAR ALIMENTOS SER PRESO POR NÃO SATISFAZER TAL OBRIGAÇÃO PARA COM O MENOR?

A título de Direito Comparado, podemos anotar que, por exemplo, actualmente no Brasil a lei é muito clara. Devido a uma imensidão de casos de falta de pagamento de alimentos devidos a menores, ocorrida num passado próximo, o legislador brasileiro decidiu intervir, criando o instituto da
"Prisão Civil por Inadimplemento de Pensão Alimentícia"

Dispõe o Art. 733ºdo C. Proc. Civil Brasileiro:

"§ 1º Se o devedor não pagar, nem se escusar, o juiz decretar-lhe-á a prisão pelo prazo de um a três meses.
§ 2º O cumprimento da pena não exime o devedor do pagamento das prestações vendidas ou vincendas.
§ 3º Paga a prestação alimentícia, o juiz suspenderá o cumprimento da ordem de prisão."

E determina a Constituição Federal do Brasil (1988) no seu Art. 5º, LXVII:

"Não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel".

Resta referir que na República Federativa do Brasil, a lei é cumprida e não são raros os casos de prisão por falta de pagamento de pensão alimentícia!

Normalmente, a pena de prisão é executada em regime aberto, ou seja, permitindo ao condenado passar os dias (não as noites) fora do Estabelecimento Prisional ou Presídio, de molde a poder trabalhar e ter condições para cumprir com o pagamento dos alimentos devidos.

Entre nós, apesar de se clamar que não existe prisão por dívidas e que ninguém pode ser preso por falta de pagamento de obrigação a que estava adstrito, não nos podemos olvidar de que também o nosso Código Penal prevê e pune, no seu Art. 250º, o crime de "Violação da obrigação de alimentos".

Ou seja: SIM! PODE O ALIMENTANTE DEVEDOR SER CONDENADO A PRISÃO!

A lei prevê uma pena máxima de 2 anos de prisão ou 240 dias de multa.

Há então que aferir com seriedade, e conscientemente, o justo valor (de acordo com as possibilidades do alimentante e as reais necessidades do alimentando) a fixar a título de alimentos devidos a menor. Assim como há que aferir se as possibilidades económicas existiam ao tempo da decisão judicial que fixou alimentos e, à posteriori e voluntáriamente, com a intenção de não prestar alimentos, o alimentante se colocou na impossibilidade de o fazer e violar a obrigação a que está sujeito. (Art. 250º nº2 do Cód. Penal).

Resta referir que, ao contrário do que sucede no Brasil, em Portugal não tenho informação, nem conhecimento, de nenhuma condenação a pena efectiva de prisão por falta de pagamento de pensão alimentícia!


2 comentários:

Unknown disse...

depois de ter ido a juiz, quanto tempo a progenitora terá que esperar para o devedor pagar a sua divida de pensão de alimentos...
aguardo uma resposta se possivel visti o tribunal de menores do porto não me notificar para tal.
obrigado pela atenção

PeT!Te disse...

boa sorte... eu estou sem receber um tostão há 7 anos! ele não paga e nunca pagou, a pensao já foi fixada nos 75, nos 100, nos 125, nos 25, etc... nada lhe acontece, porque é esperto e trabalha mas não faz descontos, ainda recebe o RSI! e eu, que sustente sozinha a nossa filha deficiente, pago escola, atl, terapia, médico, tudo! ainda bem que não tenho medo do trabalho e nada falta ou faltou alguma vez à minha filha. o que lhe falta muitas vezes (e durante os primeiros 4 anos de vida ininterruptamente!) é as visitas do chamado progenitor, que só vem quando quer e se, por algum acaso, não estamos à espera dele, chama a polícia e quem é julgada num processo crime por substração de menores sou eu! tenho mesmo muita pena de ter nascido em Portugal, pois em qualquer outro país esta situação já tinha sido resolvida há muito. enfim...