domingo, 24 de agosto de 2008

Da Desqualitativa Mediatização da Justiça

Na sociedade em que actualmente tentamos subsistir, torna-se cada vez mais recorrente lermos ou escutarmos notícias insípidas do género "(...) a polícia acabou por prender um indivíduo de 26 anos de idade e já referenciado pelas autoridades. Contudo, após interrogatório, o juiz optou por não lhe aplicar nenhuma medida de coacção e decretou que fosse embora em liberdade".

Este tipo de notícia, fruto de uma crescente e não inconsequente mediatização dos assuntos jurídicos, deixa-me profundamente consternado! Consternado porque, conscientemente, reconheço que ela encerra em si mesma uma futilidade demagoga e sensacionalista, cujos únicos alvos são o mercado jornalístico, as vendas e os lucros. Consternado... porque denota uma clara falta de cultura jurídica por parte de alguns jornalistas - que não têm por obrigação a ter - mas de igual modo revela um facilitismo na investigação jornalística; um descuidar de deveres no aprofundamento das matérias sobre as quais versam as notícias que escrevem. Revelam que quem escreve a notícia não sabe do que "fala" ou/e, ainda mais grave, que também não teve interesse e cuidado em munir-se de tal conhecimento.

Caríssimos... o indivíduo terá sido detido em flagrante e não preso. Ao indivíduo terá sido aplicada, pelo menos e com toda a certeza, uma medida de coacção: o Termo de Identidade e Residência.

Os media descobriram o "filão de ouro": notícias sobre segurança e Justiça! Aproveitam exaustivamente esse "filão" incrementando o aumento de informação acerca de tais temas. Nunca tanto como hoje se ouviu ou leu sobre criminalidade, Justiça, Ministério Público, julgamentos, PGR, etc... O cidadão está actualmente mais informado sobre a Justiça portuguesa do que estava há cerca de 10 anos atrás... Contudo não o está melhor que há 10 anos atrás! Quantidade não é sinónimo de qualidade! É mais informado... mas com erro -grosseiro por vezes!! Não há zelo na investigação e na aferição da veracidade das informações obtidas! Em alguns casos, pasme-se, chega-se ao cúmulo de nem haver investigação jornalística, limitando-se a transcrever "peças" de uns meios de comunicação para outros, não se alterando nem uma vírgula!

Quantidade em detrimento da qualidade... é isto que se constata no panorama jornalístico nacional.

Mas a gravidade da situação não se resume à pobre e errónea informação transmitida por alguns jornalistas da nossa praça. Graves e perigosas são as consequências que dela advêem - um crescente fluir na mente do cidadão de que a Justiça não funciona e que mais vale adquirir uma arma num qualquer "mercado negro" e recorrer à
"vendetta" privada!
Consequências práticas já as vivemos: bastará, num qualquer
"bar de pueblo" português, questionar quem lá se encontre acerca da Justiça e da sua eficácia; questionar quem ou quantos dos presentes tem armas em casa; perguntar se estariam na disponibilidade de as usarem, para fazerem a sua própria justiça, caso se tornasse necessário e, após o escutar de vários e saudosos anseios pelo regresso do Antigo Regime, in fini, retirar ilações!

Pessoalmente, bem sei que o sistema jurídico português se contorce enfermo de várias maleitas. Mas ainda vive!! Ainda acredito e quero acreditar na JUSTIÇA e que vale a pena lutar pela sua realização num efectivo Estado de Direito.

"IUS ET IUSTITIA FUNDAMENTUM REGNORUM"


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